Com a aproximação das novas eleições municipais, as comunidades católicas voltam a ser confrontadas com as divisões de ordem ideológico-partidária. É inegável que os princípios da Doutrina Social Católica têm peso político e que a Igreja fornece critérios para a participação política e para as escolhas eleitorais. Contudo, como sabiamente lembra o Compêndio da Doutrina Social da Igreja (CDSI), “as instâncias da fé cristã dificilmente são assimiláveis a uma única posição política: pretender que um partido ou uma corrente política corresponda completamente às exigências da fé e da vida cristã gera equívocos perigosos” (CDSI 573).
Sendo assim, é natural que as opções políticas dos católicos se distribuam por vários partidos, lançando dois importantes desafios ao povo de Deus. Em primeiro lugar, uma vez que a unidade é o sinal mais evidente da presença de Cristo entre nós (Jo 17,21-23), como conciliar a pluralidade própria da política com a unidade que deve nos caracterizar? Em segundo lugar, como os critérios que nascem da Doutrina Social da Igreja devem nos orientar, sem com isso forçar um pensamento único e uniforme?
O Magistério da Igreja nos convida à adesão consciente aos princípios da sua Doutrina Social. Contudo, citando Bento XVI, “a Igreja não pode nem deve tomar nas suas próprias mãos a batalha política para realizar a sociedade mais justa possível. Não pode nem deve colocar-se no lugar do Estado. Mas também não pode nem deve ficar à margem na luta pela justiça. Deve inserir-se nela pela via da argumentação racional e deve despertar as forças espirituais, sem as quais a justiça, que sempre requer renúncias, não poderá afirmar-se nem prosperar” (Deus Caritas Est). Assim, as respostas aos dois desafios não estão em um distanciamento prudente entre a comunidade e o debate político, mas sim em um posicionamento cada vez mais consciente das razões e motivações dos princípios cristãos para a ordem social, capaz de respeitar a justa autonomia de cada cidadão, ao mesmo tempo que lhe dá critérios sólidos para a construção do bem comum.
A indicação de candidatos e partidos, prática comum na Igreja em alguns momentos do passado, em função de conjunturas específicas, não é mais uma orientação sugerida em nossos dias. Em seu lugar temos a ênfase em uma prática política orientada pela caridade social, que condiciona um modo de fazer política no qual os católicos podem se reconhecer mutuamente e encontrar caminhos compartilhados para o diálogo e a justiça social, independentemente das opções partidárias.
Raiva e ressentimento, escândalos e cancelamentos, determinam cada vez mais a dinâmica de participação política dos brasileiros. Redes sociais e influenciadores, preparados para explorar as emoções e despertar paixões, muitas vezes se valem de visões parciais, quando não distorcidas, dos princípios cristãos para atrair os católicos para suas posições partidárias, fraturando a unidade eclesial. Diante disso, as lideranças comunitárias devem estar bem-preparadas tanto para orientar quanto para acolher os que pensam como elas bem como aqueles que pensam de modo diferente.